terça-feira, 13 de maio de 2014

Martinho e a melancolia.

Martinho estava sentando em sua cama olhando as paredes de seu quarto, não conseguia dormir, vi-as descascar dia após dia, mas nada fazia para isso mudar, olhava com atenção a rachadura que ia de sua janela até a prateleira cheia de livros velhos, que nunca tinha lido apenas os possuía na esperança de um dia começar a ler, a xícara de chá quente fumegava em suas mãos e o cheiro doce do chá de hibisco invadia suas narinas entupidas pelo catarro decorrente da gripe que pegara, sua mãe havia lhe dito que o sereno faria mal e ele nem ligava, a febre o fazia suar e ter calafrios, Martinho não compreendia tal paradoxo. Ainda sentado em sua cama o jovem observava a poeira que cobria os seus livros e deseja volta e meia ser apenas um grão de poeira que é soprado de lá pra cá, pelo vento, sem compromissos com nada e nem ninguém e sem se perguntar se estaria a incomodar a senhora da casa, a poeira agasalhava seus livros bem como o cobertor seu corpo, o suor continuava e o chá já não fumegava mais, resolveu bebê-lo, sentiu o sabor azedo em sua boca e arrepiou-se como quem se arrepia a chupar um limão. Martinho olhou pra sua mesa de estudos e lembrou-se de tudo que ainda precisava ler e aprender e só de pensar já não queria mais, já estava cansado, só queria ser um grão de poeira, tudo isso passou por sua cabeça em uma fração de segundos que duraram anos, o que Martinho queria de verdade é como eternizar.  Bebeu metade do seu chá pôs a xícara no chão, ao lado da cama e deitou-se e pôs a observar a lâmpada queimada de seu quarto, ele começou a perceber o quanto ele e aquela lâmpada tinham em comum, era incrível como um objeto inanimado trazia consigo tanto de uma pessoa, Martinho se viu naquela lâmpada como uma mulher que vê seu reflexo no espelho, O jovem permanecia apagado, sempre apagado, mas sabia que em si assim como na lâmpada, já havia reinado a luz, um dia talvez, quem sabe, Martinho troque a lâmpada, mas ele sabia que não podia trocar-se. Adormeceu e sonhou, sonhou ser um grão de poeira, sem obrigações, sem preocupações, sem sentimentos e nenhuma daquelas frívolas complicações humanas, talvez um dia assim o fizesse bem.

O dia passou sem a observação de Martinho que dormia de forma pesada, nem as batidas da sua mão na porta o acordaram nada o acordaria, já não estava mais ali. A noite iniciou-se doce e calma assim como todas as noites, e bem no iniciou da madrugada o jovem despertou ironicamente cansado de ter dormido tanto, espreguiçou-se coçou as axilas e cheirou os dedos, cheiro horrível, suara durante o sono suara tanto que acabara molhando a roupa que vestia e os lençóis, levantou-se da cama silenciosamente e começou a perceber o quanto escura estava seu quarto, abriu a porta do quarto silenciosamente, impedindo-a de ranger, olhou para o céu e deparou-se com uma grande lua que parecia lhe observar, pegou a toalha no quintal, foi até o banheiro, despiu-se e olhou para seu corpo, parecia mais magro, toucou-se passou um bom tempo diante do espelho discutindo mentalmente com seu reflexo coisas malucas de um universo infantil, tocou o rosto, que parecia ter envelhecido muito desde a última vez que se olhou, aproximou-se do espelho e beijo-o como se beijasse a si mesmo, um beijo longo e insano na superfície fria que repetia seus atos e retribuía-lhe o beijo com a mesma intensidade e carinho apesar da frieza sentida pelos lábios, Martinho cessou o beijo  limpou a saliva com as mãos e voltou a se olhar, e voltou a perceber-se patético após o ato, era como masturbar-se contemplando as mulheres das revistas masculinas sabendo que nunca as teria, ele nunca abraçar-se-ia por mais que desejasse, tocou o rosto do reflexo como quem acarinha a namorada e pensou consigo mesmo pra onde iria quando tudo aquilo acabasse, onde acabaria quando a juventude cessasse e as dores começassem a devorar-lhe os ossos e a catarata comer-lhe os olhos, quando esse loucura iria acabar aonde tudo isso ia dar, não entendia , simplesmente não se compreendia, a partir desse momento sua mente passou a trocar de pensamentos com a velocidade com que se rouba, ágil e furtivamente, uma velocidade que nem mesmo o próprio Martinho tinha condição de acompanhar, aquilo era confuso, mas afinal de contas o que não era confuso para ele. Sentiu uma vontade de masturbar-se como se com a ejaculação pudesse botar pra fora os pensamentos  junto com o sêmen, entrou debaixo do chuveiro, ligou a torneira e deixou a água cair em seu corpo. A água gelada escorreu por suas costas e fez ele contorcer-se, depois que foi se acostumando aquela temperatura começou a relaxar seu corpo e permitir que o líquido tomasse conta de seu corpo e invadisse as rugas de seu corpo encharcando também seus pelos abundantes, pegou o sabonete, esfregou em suas axilas, e partes intimas, depois em seu rosto, fez tudo automaticamente, sem pensar em nada, limpou o suor do corpo e a água fria fez com que os pensamentos sumissem de sua cabeça por um tempo, após o banho, enxugou-se foi para o quarto vestiu um a das velhas cuecas folgadas deitou-se na cama e acariciou a própria barriga, sentindo os pêlos em volta de seu umbigo fundo, e relaxando sobre os lençóis ainda aquecidos, a madrugada parecia não passar, a lua ainda brilhava no céu e parecia não querer ceder espaço para o sol, a lua parecia não querer morrer, não queria nascer e durar uma noite apenas, é muito pouco, chega a ser patético, Martinho levantou-se rapidamente e olhou a lua mais uma vez antes de voltar a deitar, ele parecia ter sentido o que a lua sentia, é patético nascer e viver uma só vida, chega a ser patético viver. 

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